Por um ensino melhor! – Carta aberta ao Sr. Primeiro-Ministo

CategoriasComunicados / Educação

Sr. Primeiro-Ministro António Costa

No Verão passado, o seu Governo levou tempo excessivo a responder às calamidades dos incêndios. Neste Verão de 2018, o seu governo está a criar uma calamidade na Educação.

Às minhas mãos chegaram pareceres de especialistas da Educação, nos quais confio além de que, como qualquer cidadão, ouço os clamores de uma classe já demasiado sacrificada à qual junto a minha voz. Desde já lhe peço que fixe um número: 9-4-2, o número de emergência da Educação. Tal como se chama o 112 para as emergências da Saúde, se utilizar o 9-4-2, talvez ainda evite a calamidade da Educação

Permita-me que lhe diga porquê:

  1. Autonomia e Flexibilidade Curricular, e Educação Inclusiva (DL 54 e 55 de 6 de julho de 2018), são documentos que introduzem uma nova visão da educação, e uma mudança de paradigma, para ir ao encontro dos desafios educativos do século XXI.
  2. Esta legislação vem operacionalizar uma nova visão sobre o futuro da educação, e dando sentido a documentos que saíram no decorrer deste ano letivo, a saber; A Estratégia Nacional para a Cidadania; O perfil do aluno do século XXI e as Aprendizagens essenciais de todas as disciplinas de todos os anos de escolaridade.
  3. Este conjunto de documentos pode mudar para melhor o futuro da educação em Portugal. Neste aspeto o seu Governo está de parabéns, pela visão, e capacidade de atualização resultante de um projeto-piloto implementado em escolas portuguesas que se voluntariaram e que foram acompanhadas no terreno.
  4. Mas o que o Ministério da Educação faz bem, por outro lado desfaz. A política do seu Governo para as escolas e os professores está a inviabilizar os recursos humanos que deveriam aplicar os diplomas que acabam de ser promulgados. Numa palavra, o Ministério da educação está a destruir os profess4ores que deveriam aplicar.
  5. A não contagem integral de quase uma década de tempo de serviço prestado – 9 anos, 4 meses e 2 dias – é um atentado à classe a quem é pedido um esforço para se apropriar do conteúdo dos novos diplomas, alterar as práticas e implementar novos normativos a partir do dia 1 de setembro.
  6. Os professores estão desgastados, sem tempo nem condições. O seu governo está a minimizar problemas reais, como sejam a exaustão emocional (burnou e o envelhecimento do corpo docente, o excesso de burocracia a que obrigam professores e diretores de escola, a sobrecarga de tarefas e horários. Acresce que nos últimos dez anos (2008-2018) os professores perderam poder de compra e ao serem “descongelados” nada de significativo mudou nas suas vidas.
  7. Com a péssima politica em recursos humanos, o seu Ministério da Educação está a inviabilizar as boas políticas de inovação pedagógica, trabalho colaborativo. Assume uma posição pública de desvalorização dos professores, optando por políticas de betão, sem perceber que apostar na educação é um investimento no país, o único com repercussões garantidas no desenvolvimento dos Portugueses.
  8. Relembro-lhe os seguintes factos que se devem aos professores:
    1. A história da escola pública democrática é uma história de sucesso; nas últimas quatro décadas Portugal recuperou de um atraso histórico. Em 1974 41 mil alunos estavam no ensino secundário e em 2017 tivemos 400 mil alunos. Em 1980 apenas 12% dos alunos concluía o ensino secundário. Em 2007 concluem cerca de 60%.
    2. Desde 2000 até 2018 os resultados escolares de Portugal nas avaliações internacionais do PISA têm subido todos os anos. As competências dos estudantes portugueses testados nesses testes internacionais aproximam-se dos outros sistemas de ensino.
    3. Os nossos estudantes que usufruem de programas Erasmus não têm dificuldades na integração nos sistemas de ensino de outros países.
  9. Agora compare como o seu Governo está a tratar os professores:
    1. Os professores são a única classe profissional deste país obrigada a efetuar formação contínua, anualmente, fora do seu horário de trabalho e a maior parte das vezes paga pelos próprios.
    2. Os professores são a única classe profissional que em concursos precários tem de redefinir a sua vida de dois em dois anos, sendo que uma parte anda todos os anos com a casa às costas, pelo país, sem subsídio de deslocação e até aos 55 anos.
    3. Os professores trabalham na escola em casa 2x ou 3x o número de horas do horário oficial. Segundo o relatório da OCDE: O volume de trabalho dos docentes portugueses é superior à média da OCDE (2014, p.4).
    4. Face a isto que lhe pedem os professores? Os professores não estão a pedir retroativos. Os professores não estão a pedir aumentos. Os professores não estão a pedir subidas automáticas na carreira. Estão apenas a pedir que lhes seja contado o tempo que trabalharam: 9 anos 4 meses e 2 dias. 9-4-2.
  10. Nas últimas décadas o país ganhou a batalha da massificação da educação. Uma vez resolvidos os problemas de alargamento do sistema educativo português, dando acesso universal, está na hora do aprofundamento, de apostar na qualidade, permitindo o acesso de todos ao sucesso. Apostar na qualidade não se resolve apenas por mudanças legislativas. É preciso cuidar das condições humanas, é preciso assegurar a disponibilidade e o envolvimento de todos, dignificar o processo educativo, o único elevador social que permite sair da pobreza. É preciso cuidar dos agentes educativos, valorizá-los para que em conjunto o país tenha futuro.
  11. Há problemas graves ainda por resolver no nosso sistema educativo. As elevadas taxas de retenção e de abandono, por exemplo, só serão superadas com um trabalho no terreno que dê condições práticas para uma diferenciação pedagógica real, metodologias ativas e processos de trabalho que conduzam a uma aprendizagem dos nossos alunos; tudo isso é incompatível com o excesso de burocracia e a falta de reconhecimento profissional do nosso corpo docente ou a não contagem integral do tempo de serviço público prestado com qualidade e que contribuiu para o reconhecimento da OCDE em matéria de educação.
  12. É importante que a aposta na educação não seja apenas no papel. A produção de diagnóstico, e a mudança de legislação não é difícil. O mais difícil é o que falta fazer: a implementação, a execução, a mudança prática, a apropriação e interiorização de um novo paradigma educativo. Nenhuma mudança significativa na escola portuguesa irá ocorrer se o seu Governo continuar a menorizar os professores agentes educativos, tratando-os “abaixo do betão”.
  13. Os Portugueses sabem que 112 é o número de emergências de saúde. Agora sabem que 942 é o número das emergências da Educação. Não deixe que o seu governo, como na época de incêndios de 2017, só atue após a calamidade que já está a acontecer na educação. 97% dos professores – dizem as sondagens – estão revoltados com a falta de contagem do tempo de serviço e vão justamente recusar-se a implementar as políticas do ministério da Educação. Os Portugueses saberão quem foi o responsável dessa calamidade.
  14. Os professores não exigem que o Ministério da Educação contabilize o tempo de serviço todo de uma vez só. Há várias soluções possíveis relacionadas com a idade de reforma, com a contagem progressiva de tempo de serviço, etc. Só não é aceitável apagar dez anos da vida de ninguém. Não pode dizer a um estudante do 10º ano que agora tem de voltar para o 1º ano, pois não trabalhou nesses anos. Não pode dizer a uma mãe que elogia os professores que levaram o seu filho desde o 1º ao 10º ano que os professores não trabalharam esse tempo.
  15. É altura de os dinheiros públicos serem investidos nas áreas fundamentais como educação, saúde e justiça. É tempo de parar de injetar dinheiros públicos prioritariamente nos bancos e no betão.
  16. Acreditamos que o seu Governo ainda vá a tempo de ter bom senso. Manter esta intransigência de recusar a contagem integral do tempo de serviço dos professores, fará cair por terra as mudanças pedagógicas que urgem. O país sabe que a aposta na educação pública é um bem maior. O nosso atraso histórico na educação é grave demais para continuarmos a perder tempo. Para o desenvolvimento e futuro do nosso país, precisamos de qualificar e apaziguar os agentes educativos.

Lisboa, 7 de Julho de 2018
Mendo Henriques, Presidente do Nós, Cidadãos!

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